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  • Quiz da Independência do Brasil

    O Canal Curta História está lançando o jogo de Quiz da Independência, aproveite esta oportunidade de utilizar esse jogo de Quiz para trabalhar o bicentenário da Independência do Brasil. Quiz da Independência do Brasil: jogo de História para baixar O Quiz da Independência do Brasil é um jogo de História produzido para aulas de História, e faz parte de um projeto nosso dedicado à produção de jogos educativos de História voltado para a sala de aula, cujo objetivo principal é disponibilizar aos professores de História ferramentas que o auxiliem em suas aulas. Um jogo de Quiz de História pode ser muito mais interessante do que parece à primeira vista. Utilizando o Quiz na tela do computador ou projetando-o em sua sala de aula, você pode explorar além do conhecimento sobre o conteúdo também imagens ou fontes sobre o tema explorado. O formato "Quiz" pode ser utilizado tanto impresso quanto digital e pode ser jogado em equipes ou individualmente. No caso desse jogo, porém, ele não feito elaborado para impressão, é um jogo feito especificamente para a tela de computador e não funciona no Mobile. Mas é claro que, pensando no ambiente escolar, jogos em equipe são muito mais interessantes e divertidos. Jogos educativos podem ser muito mais do que cruzadinhas Além do Jogo de Quiz temos trabalhado e desenvolvido diversos tipos de jogos educativos: jogos de tabuleiro, jogos de Quiz, jogos de pistas, jogos da memória, jogos para imprimir ou para serem projetados na sala de aula, etc., alguns desses jogos educativos estão disponíveis gratuitamente aqui nesse link, outros serão ofertados como bônus exclusivamente aos inscritos no curso de gamificação "Jogando com a História". Para que você possa conhecer um pouco do que terá acesso ao se inscrever no nosso curso acesse os jogos ofertados gratuitamente, temos por exemplo, o jogo de Quiz das Revoltas do Brasil no período regencial que você pode acessar na página dos nossos jogos (clique aqui). O jogo de Quiz no contexto da gamificação Com a experiência acumulada no desenvolvimento de jogos de História para sala de aula disponibilizados gratuitamente no site Canal Curta História que você pode acessar aqui, desde 2020 temos contribuído com jogos com conteúdo de qualidade sobre diversos temas de História do ensino fundamental e ensino médio. No intuito de aprofundar esse trabalho e também auxiliar professores interessados em gamificação no ensino, decidimos produzir um curso online sobre gamificação e o uso de jogos pensados exclusivamente para o ensino de História, (clique aqui para saber mais). Enfim, um jogo nunca é apenas um jogo, mas uma oportunidade de aproveitar o engajamento dos seus alunos à favor de sua aula, pois atentos e participativos os alunos aprendem muito mais!

  • Revolta dos Muckers

    Por Deise Joana Tome da Silveira; Fabio A. G. Kochen; Felix Venicius Sostisso Eichelberger; Jakeline Foster; Thaís Camila do Nascimento e Thaís Tomé (graduandos em História - Unioeste) Em 1822, o Major George Anton Von Schaffer saiu do Brasil rumo a Europa com a missão de recrutar emigrantes para ocupar as terras brasileiras. Inicialmente ele se dirigiu a Hamburgo e dali partiu para outros territórios alemães como Hanôver, Pomerânia entre outros. Os primeiros emigrantes chegaram aos portos do Rio de Janeiro em março de 1824. Para fazer com que as pessoas se interessassem em migrar para o Brasil, a Coroa ofereceu diversos benefícios, entre eles as custas da passagem da Europa até o Brasil, uma porção de terra com cerca de 78 hectares e subsídios de 160 réis por um ano e meio. Além dessas ofertas, houve a promessa de cidadania brasileira imediata e liberdade de culto, no entanto o Império funcionava sob o Regime de Padroado, isto é, o catolicismo era religião oficial do Estado. Ao chegarem aos portos do Rio de Janeiro, os imigrantes foram distribuídos para as localidades distintas. Em julho de 1824, as terras de São Leopoldo no Rio Grande do Sul começaram a receber os primeiros imigrantes. Tudo era muito dinâmico, pois para os imigrantes a vinda para o Brasil significava a possibilidade de começar uma nova vida. Mas para além da esperança de prosperidade em uma nova terra, eles enfrentavam o desafio do desconhecido pois eles passariam a viver um novo universo, totalmente diferente dos seus países de origem tanto em termos geográficos, climáticos, culturais e econômicos. Além disso, impactava diretamente na adaptação dos recém-chegados a grande distância existente entre as expectativas criadas e as promessas feitas (o que fez muitas pessoas migrarem para o Brasil) da realidade vivida por eles quando chegavam nas regiões coloniais. Existia uma lacuna muito grande entre aquilo que era prometido na Europa aos imigrantes e aquilo que a realidade brasileira efetivamente oferecia. Devido a isso e a outros fatores, a adaptação dos imigrantes a nova sociedade nem sempre foi tranquila. Em alguns casos, esta situação acabou gerando conflitos de proporções maiores. Um deles entrou para os anais da história brasileira - “A Revolta dos Muckers”. A revolta que ocorreu de 1873 a 1874 na colônia de São Leopoldo, localizada na província de São Pedro do Rio Grande do Sul, está diretamente relacionada ao processo de adaptação dos imigrantes a nova realidade nacional e foi uma consequência do modo como a política de imigração e colonização desenvolvida pelo Império foi administrada. Um dos principais objetivos dessa política foi o de buscar a substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre Além da tentativa de branqueamento da população brasileira. O problema da mão de obra ganhou proporção e prioridade no Brasil a partir da segunda metade do século XIX com foco principal em atender aos interesses dos grandes fazendeiros. Assim, toda a política de imigração e colonização desenvolvida no período não levou em consideração os anseios e desejos das populações imigrantes, bem como dos grupos que viviam nas regiões de fronteira agrária onde as colônias geralmente eram estabelecidas, como os indígenas, as populações caboclas, os escravos fugitivos e libertos. A memória da Revolta A documentação sobre a Revolta dos Muckers, em sua maior parte foi produzida a partir do ponto de vista de representantes dos grupos dominantes ou por agentes do Estado. Nela predomina uma leitura preconceituosa sobre os Muckers e os acontecimentos que envolveram esse conflito. Eles são apresentados e representados como “fanáticos”, pessoas “violentas”, “ignorantes”, e que, a proporção que a revolta tomou, foi consequência das características desses indivíduos. Além dessa representação estar presente na documentação e na história “oficial” há também uma memória construída sobre o evento que se pauta na ideia de que os Muckers eram somente fanáticos religiosos e que todo o conflito aconteceu devido a esse fanatismo, quando na realidade esses sujeitos estavam vivenciando a experiência de uma nova vida em uma terra muito distinta e frustrados com a realidade da situação dos imigrantes no país que era totalmente diferente do prometido à eles enquanto estavam na Europa. Os Muckers Os Muckers eram um grupo de imigrantes alemães composto de mais ou menos 150 pessoas que haviam chegado na colônia de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, na década de 1870. O grupo constituía-se de uma comunidade fundamentada a partir das leituras da Bíblia e na realização de práticas curativas feitas por Jacobina Mentz Maurer e seu marido João Jorge Maurer. Nos seis anos em que atuaram no interior da comunidade, o casal Maurer conquistou um número expressivo de simpatizantes legitimando sua existência, tal como suas práticas. Como uma forma de expressão de sua separação com o mundo exterior, os adeptos das práticas em conjunto com os seus líderes, desenvolveram uma série de condutas próprias que em grande medida se distanciavam das normas do Império. Como forma de organização, desenvolveram um calendário próprio para ser seguido pelos membros do grupo. Datas como o dia que Jacobina Maurer saiu da Santa Casa de Misericórdia em Porto Alegre, local onde ficou em reclusão para inquérito policial, e o dia que chegou em São Leopoldo, especificamente em Ferrabrás, eram comemorados como dias santos. Desta forma, é visível como bem estruturado era a comunidade. Jacobina apresentava crises de desmaio e sonambulismo desde os 14 anos. As pessoas a sua volta acreditavam que tais sintomas eram sinais sagrados. A imagem da líder chegou a ser relacionada com a de Jesus Cristo, devido aos atos de bondade e por sua dedicação aos “menos afortunados”. Porém para a comunidade local os Muckers não eram bem-vistos. Os colonos os consideravam fanáticos religiosos, devido aos costumes e práticas distintas e por este motivo e por receio de sofrerem violências e repressão, os Muckers não frequentavam as escolas e as igrejas. Devido a popularidade negativa dos Muckers, o grupo começou a ser culpabilizado por diversos incidentes, como assassinatos e atentados. Diante dos olhos do Estado, os Muckers eram considerados uma ameaça para a ordem social e deveria ser contida. A repressão A repressão aconteceu mesmo sem motivos evidentes contra os Muckers. Tratava-se de um grupo de pessoas que estavam organizados em torno de preceitos religiosos e marcado por uma leitura particular dos ensinamentos bíblicos que estava diretamente relacionada a situação vivida na colônia e da experiência de imigração. Além disso, as autoridades eclesiásticas não viam com bons olhos o fato de que um número significativo de pessoas se reunia de forma autônoma e fazia leituras próprias dos significados dos textos bíblicos, portanto, poderiam representar algum perigo a autoridade da Igreja. Sendo o catolicismo a religião oficial do Estado Imperial, as outras religiões tinham sua liberdade de expressão controladas pelo Estado. Essa insegurança aliada ao preconceito religioso juntou-se a diversos boatos infundados e acusações falsas aos integrantes do grupo, como a morte de Jacob Kramer, comerciante e opositor do grupo, encontrado morto dias depois de desaparecer, mesmo sem terem achados quaisquer vestígios de violência, espalhou-se a notícia de que Kramer teria sido morto pelos Muckers. Outro incidente contabilizado aos integrantes da comunidade, em especifico a Jacobina, um morador local chamado Pedro Hirt sofria com hipocondria e dias após visitar a cada da líder do grupo cometeu suicídio. Os moradores locais acreditavam que a tragédia aconteceu sob a influência do casal Maurer. Outro episódio ocorreu quando o inspetor João Lehn, ficou gravemente ferido após ser atacado por dois homens a cavalo em frente a sua residência e a responsabilidade do ataque também foi creditada sem provas aos Muckers,. Esta última acusação foi responsável pela prisão de 33 Muckers que foram levados a São Leopoldo. Em 1873, foi realizado um primeiro ataque contra o grupo pelas tropas do exército com a colaboração dos colonos que viviam nas proximidades. Os Muckers conseguiram resistir e chegaram a matar um dos comandantes na investida. As perseguições persistem e na noite de 25 de junho de 1874, os Muckers revoltaram-se com as injustiças e atacaram alguns de seus principais opositores, incendiando suas casas. Muitos colonos reuniram-se com medo dos ataques e promoveram na noite seguinte uma retaliação ao grupo de imigrantes, cerca de oitenta homens atacaram, saquearam e incendiaram várias casas abandonadas dos Muckers. Os ataques continuaram nos dias que se seguiram, as disputas e brigas eram intensas até que no dia 28 de junho de 1874, o coronel Genuíno Sampaio acompanhado de 98 homens seguiu para o Morro Ferrabraz e atacou os Muckers, parte deles conseguiram fugir. No dia 19 de julho do mesmo ano aconteceu um outro ataque ainda mais violento, a casa dos Maurer foi incendiada e vários homens, mulheres e crianças foram mortos, roubados e violados, inclusive a líder teve seu rosto desfigurado no ataque. Jacobina e mais 17 muckers conseguiram fugir. No entanto, a perseguição continuou até que em 02 de agosto de 1874 o restante do grupo foi morto brutalmente pelas tropas governamentais. Os que sobreviveram a esse terrível ataque foram presos e investigados pelo Estado. [1] ABDELMALEK, Sayad. A imigração ou os paradoxos da alteridade. 1ª ed. Editora EDUSP. São Paulo, 1991. p. 10-72. [2] GEVEHR, Daniel Luciano. Fier-à-Bras: As diferentes representações do cenário do conflito Mucker. Revista Mouseion, n. 16. Canoas, dez.2013. p. 75-95. [3] DICKIE, Maria Amélia Schmidt. Afetos e circunstâncias: um estudo sobre os Mucker e seu tempo. Tese (Doutorado em Antropologia Social) Universidade de São Paulo. São Paulo, 1996. [4] KUNZ, Marinês Andrea. O Movimento Mucker: suas relações com a igreja católica e a protestante. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, v. 4, n. 8. 08 dez. 2012.

  • RESISTÊNCIAS NEGRAS NO BRASIL COLONIAL

    Por Cristhian Mensch; Daniela Henrichsen e Vanessa Evangelista Rocha (graduandos em História - Unioeste) Em resposta às políticas de domínios de escravos, os africanos organizaram-se de diferentes maneiras para colocar limites à violência na qual eram submetidos. Pois, como nos mostra a historiografia, onde existiu escravidão também houve formas de resistência. Resistências negras no Brasil: Fugas de rompimento e Quilombos Ainda que a formação econômica e social da América Portuguesa tenha sido sustentada em um regime escravista, seria um erro pensar que este sistema tenha se desenvolvido sem que os africanos, trazidos como escravos, não tivessem esboçado formas de contestação a condição de vida que lhes era forçada. Uma das formas de resistência à escravidão eram as fugas. Elas foram uma das estratégias mais utilizadas pelos sujeitos escravizados como forma de resistir à sua condição. Algumas vezes elas ocorriam ainda dentro dos navios negreiros, quando os africanos dominados pelo medo da travessia oceânica e pelo medo do futuro que lhes aguardava na América, optavam por se atirar no mar. Uma vez já desembarcados na América portuguesa, e mesmo já vendidos, os escravos ainda tentavam empreender fugas. Segundo a historiografia, havia dois tipos de fugas: a reivindicatória e a de rompimento. Nas fugas de rompimento os escravos fugiam para regiões afastadas das fazendas ou das vilas, geralmente para regiões de mata fechada. O objetivo dessas fugas era romper de uma vez por todas com a dominação. Assim os escravos fugitivos procuravam se estabelecer em locais onde eles pudessem viver livres e praticar a sua cultura de origem. Esta forma de fuga deu origem aos primeiros quilombos que ao longo dos anos se espalharam em todo o território na América Portuguesa. Os quilombos se tornaram uma das principais formas de resistência da população negra no Brasil até o final do século XIX e ainda hoje existem e resistem em diversas comunidades quilombolas remanescentes em nosso país. Um dos quilombos mais famosos é o de Palmares, que no século XVII se encontrava na Serra da Barriga dentro da capitania de Pernambuco e que nos dias de hoje fica no território do interior de Alagoas. A fama de Palmares se explica por várias razões: foi o quilombo mais duradouro da época do Brasil Colônia, tendo resistido durante todo o século XVII. Outra razão da importância de Palmares é que no seu apogeu ele pode ter sido habitado por até 30 mil pessoas, distribuídas em várias aldeias, descritas como bem fortificadas, estruturadas e administradas. As evidencias da magnitude de Palmares se deve aos relatos deixados pelas diversas expedições enviadas pelos administradores portugueses e holandeses de Pernambuco para destruir o quilombo. Embora cada aldeia possuísse um líder específico, todos respondiam em obediência a um líder maior. Ao longo da sua existência Palmares teve diferentes líderes, verdadeiros reis segundo alguns historiadores, sendo o mais famoso deles Zumbi, hoje símbolo do movimento negro brasileiro. Resistências Negras no Brasil: Fugas reivindicatórias O outro tipo de fuga, elencada pelos historiadores eram as fugas reivindicatórias que diferente das fugas de rompimento, tinham como objetivo principal negociar com seus senhores alguns limites à escravidão, como por exemplo, a conquista de um dia da semana para folgarem e cuidar dos seus roçados. Para conseguir abrir um espaço de negociação, os escravos fugiam para os arredores dos engenhos de açúcar até que seus senhores aceitassem negociar suas reinvindicações. Um exemplo de fuga reivindicatória ocorreu no Engenho de Santana de Ilhéus, um dos maiores da Bahia no final do século XVIII, com aproximadamente 300 escravos. Em 1789, os escravos se rebelaram contra as condições de trabalho, fugiram e refugiaram-se na mata próxima ao engenho. A fuga paralisou a produção que só retornou após o senhor do engenho, Manuel da Silva Ferreira, aceitar as reivindicações dos escravos que iam desde folgas nos fins de semana até a escolha dos feitores que deveriam ser aceitos pelo escravos. Revoltas armadas: A Revolta dos Malês Além das fugas e dos quilombos, os escravos também organizaram revoltas armadas para reivindicarem sua liberdade ou com vista a melhorar sua condição de vida. A exemplo elencamos a revolta que ocorreu na Bahia, no contexto da Independência do Brasil de Portugal, quando tropas formadas exclusivamente por negros, muitos deles escravos, auxiliaram na expulsão dos portugueses de Salvador. Esses sujeitos lutaram em troca da promessa da conquista da alforria, isto é, da sua liberdade após a guerra. Ainda em Salvador, alguns anos mais tarde da Independência, outro episódio marcante de rebelião escrava foi a Revolta dos Malês, considerada a maior revolta escrava no Brasil. O nome dado a revolta se deve pela maior parte dos envolvidos serem negros Malês oriundos da região da atual Nigéria e professarem o islamismo. [1] O castigo. Ilustração de Jean Baptiste Debret publicada na coletânea sob o título Voyage Pittoresque et Historique au Brésil (Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil). 1834 e 1839, [2] Anúncio de jornal de escravo fugitivo, 1845. [3] Selo comemorativo do Quilombo dos Palmares. Emissão Departamento de Filatelia e Produtos/ECT. 19/11/2012. [4] Habitação de negros. Ilustração de Johann Moritz Rugendas. Publicada no álbum Voyage Pittoresque (Viagem Pitoresca). 1822 e 1825 [5] REIS, João José. Rebelião Escrava no Brasil: A Historia do Levante dos Males em 1835. Editora Brasiliense, 1986. [6] REIS, João José; SILVA, Eduardo. Negociações e Conflito; a resistência negra no Brasil escravista. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

  • O IMPERIALISMO NA ÁFRICA E NA ÁSIA

    Por Bruna Carolina Teixeira Biffi; Débora Schmidt; Gabriela Pires Leonardo; Giulia B. Plassmann; Lara Dias Prado Salvador e Mateus Eduardo dos Santos (graduandos em História - Unioeste) No século XIX surgiu, entre as potências europeias, uma nova corrida em busca de colônias direcionada para os continentes africano e asiático. Esse processo ficou conhecido como imperialismo. Imperialismo ou neocolonialismo? O imperialismo ou neocolonialismo diferenciava-se do colonialismo do século XVI porque foi impulsionado no contexto do capitalismo industrial e financeiro. Isto gerou entre as grandes potências europeias um clima de competição e de disputas por matérias-primas e novos mercados consumidores para a produção industrial excedente. Assim, a ocupação de novos territórios era vista como meio para garantir o desenvolvimento de suas próprias economias e expandir seus poderes sobre outras regiões do globo. Imperialismo na África – Os exploradores Durante o contexto do imperialismo, vários exploradores, em sua maioria não cientistas, adentraram nas florestas tropicais africanas para avaliar suas potencialidades de exploração. O principal deles foi o missionário e explorador escocês David Livingstone, que percorreu 50 mil km através do continente. O repórter escocês Henry Stanley, enviado para encontrá-lo, o sucedeu nas explorações e logrou determinar o curso do rio Congo. O rei Leopoldo II da Bélgica, no afã de obter uma colônia, contrata Stanley que obtém tratados com chefes tribais que renunciam ao domínio de suas terras em favor do rei. O incômodo das grandes potências europeias, entre elas a Grã-Bretanha, se acirra quando o rei Leopoldo II estabelece a liberdade de comércio na área sob sua jurisdição, obrigando os concorrentes a fazer o mesmo. Conferência de Berlim A disputa em torno do comércio colonial culmina com a Conferência de Berlim, que ocorre entre 1884 e 1885. A conferência visava discutir os termos da partilha territorial da África e regulamentar o livre comércio de exploração. Participaram da conferência e realizaram a partilha a Alemanha, França, Grã-Bretanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Império Otomano, Portugal, Holanda, Suécia, Rússia, Itália e Império Austro-Húngaro. A França buscava na expansão imperialista recuperar sua posição de poder internacionalmente e obter ganhos para o setor privado. A Inglaterra expandiu seu império de norte a sul na África, ligando o mar Mediterrâneo ao Mar Vermelho pelo Canal de Suez, fazendo do Egito território protegido. A Bélgica explorou a bacia do Rio Congo, tendo massacrado milhares de congoleses na exploração de trabalho forçado. Formas de domínio A forma de exploração e administração dos territórios africanos foi diferente de acordo com as potências dominadoras e o tipo de populações e territórios dominados, podendo ser de forma direta ou indireta. Um exemplo de domínio direto foi sobre a Argélia pelos conquistadores franceses, que exigiram das tribos a apresentação de títulos de propriedade. Antes da conquista, porém, esses povos não demarcavam as terras, pois não havia propriedade privada individual. Assim, os franceses, seguindo suas leis, sequestraram as terras dessas tribos, venderam a sociedades colonizadoras que as loteavam. Já o domínio indireto foi exercido por meio dos protetorados, como no caso da Tunísia e do Egito, no norte da África. Os governantes locais continuavam no poder, mas eram fiscalizados por um representante do país conquistador. O objetivo era garantir a cobrança das dívidas públicas, obter vantagem comercial e impedir que a terra fosse conquistada por outro país. Em troca, se garantiria a proteção dos interesses dos governantes locais, mas eles tinham soberania limitada, não podendo realizar nenhum acordo diplomático sem consultar o país conquistador. Missão civilizatória Os povos europeus justificaram a ocupação em territórios africanos e asiáticos como uma missão civilizatória, por meio da qual levariam civilização e progresso aos povos considerados por eles atrasados. Muitos administradores, cientistas, educadores, missionários tinham o intuito de transmitir a cultura cristã ocidental, modificar a gestão do território e impor a cultura europeia. A igreja católica e religiosos protestantes investiram num surto missionário visando converter as populações locais, mediante a crença de que estariam cumprindo uma missão sagrada ao divulgarem o cristianismo. Resistências ao imperialismo Durante o domínio imperialista houve vários movimentos de resistência dos povos africanos e asiáticos como exemplo a resistência do Império Zulu em 1879. Visando conquistar reservas de diamantes, os ingleses travaram batalha com zulus e foram derrotados. A vitória britânica subsequente resultou no fim do Império Zulu, que acabou por ser dividido em 13 colônias. Ou ainda na Costa do Ouro quando o povo Ashanti deflagrou uma rebelião depois que os colonizadores ingleses retiraram do poder os representantes locais. Após uma sequência de batalhas sangrentas, o movimento chegou ao fim e os líderes foram deportados. Outro exemplo de resistência ao imperialismo ocorreu na África Oriental dominada pelos alemães, ocorreu entre 1905 e 1907 a revolta dos Maji-Maji. Seu líder Kinjikitile reuniu diversos grupos que resistiram à exploração e violência, até ele ser enforcado. Imperialismo na Ásia Já na Ásia a presença de países europeus já vinha desde o mercantilismo, com o comércio de especiarias e tecidos. A partir do século XIX essa presença foi expandida. Exemplo da força dessa presença europeia foi a Companhia das Índias Orientais, por meio da qual os ingleses passaram a dominar a Índia de 1784 a 1858. O impacto disto foi a cobrança alta de impostos, o controle das tropas de nativos e a destruição do setor artesanal da indústria indiana. O domínio inglês se estendeu até a China, quando ingleses, mas também franceses e americanos percebem a possibilidade de explorar e comercializar o ópio e a prática desse vício. Porém, o governo chinês, percebendo os prejuízos que isso trazia para a população, estabeleceu uma política de penas rígidas para o contrabando e a comercialização ilegal desse produto. Os europeus se sentiram prejudicados, dando início a represálias que levaram à chamada Guerra do Ópio que durou de 1839 a 1842. Desta Guerra saíram vitoriosos os europeus, pois a China foi forçada a abrir seus portos, favorecendo os interesses políticos e econômicos europeus. O Japão também foi muito almejado por potências imperialistas no século XIX. Em 1854, os Estados Unidos forçaram a abertura dos portos japoneses para os produtos ocidentais, pondo fim ao isolamento comercial com o ocidente. A partir de 1868 o Japão iniciou um processo de modernização de sua economia que desencadeou um rápido desenvolvimento industrial. Esse período ficou conhecido como Era Meiji. Com isso o Japão pôde evitar a expansão do imperialismo ocidental em seu território e, ele próprio, se tornar um país imperialista. Até o ano de 1914 a Ásia esteve sob domínio europeu, com exceção do Japão. O imperialismo sendo o processo de expansão dos países europeus motivados pela busca de matérias-primas, mercados e poder, originou uma significativa mudança no mapa político do mundo, resultando na formação de enormes impérios coloniais. [1] Cecil Rhodes e as possessões britânicas na África. Ilustração de Edward Linley Sambourne. [2] The Chinese Cake (A Torta Chinesa). Ilustração de Henri Meyer. Le Petit Journal. Janeiro, 1898. [3] Almanach du petit colon algérien (Almanaque do pequeno colono). Por Alphonse Birck, 1893. [4] The White Man’s Burden (O fardo do homem branco). Charge de F. Victor Gillam. April, 1899. [5] História geral da África, VII: África sob dominação colonial, 1880-1935 / editado por Albert AduBoahen. 2.ed. rev. Brasília: UNESCO, 2010. [6] MESGRAVIS, Laima. A colonização da África e da Ásia. São Paulo, 1994. [7] HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Impérios 1875-1914. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.

  • ERA VARGAS: O BLOCO OPERÁRIO E CAMPONÊS NA REVOLUÇÃO DE 1930

    Por Bruno Henrique de Souza; Pedro Henrique Leonel Zanini (graduandos em História - Unioeste) A revolução de 1930 é um processo importante para a história do Brasil e marca a nossa memória enquanto um movimento formado pelas elites de estados como o Rio grande do Sul, Minas Gerais e Paraíba e que também contou com a participação de tenentes do exército que foram contrários à continuidade das oligarquias de São Paulo e Minas Gerais na presidência. Para além dessa construção de memória histórica dos vencedores deste embate político, há sujeitos de extrema importância nesse movimento e que foram apagados pela história oficial. Apesar da revolução de 1930 ser um marco, o processo que leva até esse momento começa ainda na década de 1920, com diversos movimentos e atores políticos, como o movimento tenentista e a coluna Prestes, e que só se torna processo revolucionário em 1928. Dentro de uma diversidade de grupos, destaca-se o Bloco Operário e Camponês (BOC) e sua perspectiva sobre a revolução democrático-burguesa de 1930. O movimento revolucionário se desenvolve a partir de 1928 porque vários grupos políticos que reivindicavam a revolução tinham um acordo básico: lutar contra a oligarquia e ter Prestes como líder da oposição. Além disso, é nesse ano que o BOC se expande para várias partes do país, inclusive em São Paulo, local central das disputas da revolução de 1930. Este acordo reunia os setores descontentes da classe dominante que eram representados pelo Partido democrático; os setores médios da sociedade, como os tenentes; e a classe trabalhadora organizada no Bloco Operário Camponês. No entanto isso não significa que dentro de um mesmo grupo não havia discordâncias e disputas, isto ocorre, por exemplo, com o Grupo de Prestes que têm mais de uma formulação sobre o processo revolucionário. O Bloco Operário e Camponês foi uma organização formada por trabalhadores e camponeses que surgiu em 1927, na qual o Partido Comunista do Brasil (PCB) – que hoje é o Partido Comunista Brasileiro – atuava. Recentes no cenário político dos anos 1920, o partido comunista do Brasil já havia sido colocado na ilegalidade em 1923, mas continuavam atuando na clandestinidade na organização dos trabalhadores, sendo que a criação do BOC foi uma maneira de disputar as eleições. No projeto político do BOC a ideia de uma revolução democrático-burguesa era central para equilibrar as posições no contexto da luta de classes. Num regime democrático, os trabalhadores seriam reconhecidos como cidadãos com direitos. Deixariam, assim de ser marginalizados como criminosos. Os posicionamentos do BOC e sua leitura sobre a realidade eram divulgados pelo Jornal: “O Combate”. O BOC apoiava o Partido Democrático porque acreditava que os trabalhadores teriam direito e liberdade para poder se organizar e lutar por melhores condições de vida sem a ameaça constante de serem presos por isto. Porém o BOC, ainda em 1928, passa a se distanciar do projeto da revolução democrático burguesa, pois começa a se movimentar em direção a uma maior reivindicação dos direitos dos trabalhadores, para além da luta contra as oligarquias. Em 1929, com os feitos de uma greve de mais de 70 dias em São Paulo e a organização de uma Confederação Geral do Trabalho com mais de 60 mil operários sindicalizados, O Bloco Operário e Camponês passa a ser um incômodo muito grande para o governo oligárquico e para a oposição que almejava o poder. Depois de uma greve de gráficos em 1929, o jornal “O combate” retira o espaço do BOC de suas páginas; também neste momento o discurso contra os trabalhadores e contra o comunismo passa a ganhar mais força no partido Democrático e em outras organizações. Com a intensificação das divergências e dos ataques ao BOC, a organização decide lançar uma candidatura própria de Minervino de Oliveira para as eleições de 1930, tendo como vice o ferroviário Gastão Valentim Antunes. MINERVINO DE OLIVEIRA SE TORNA O PRIMEIRO OPERÁRIO NEGRO A PARTICIPAR DA DISPUTA PRESIDENCIAL DO BRASIL! Minervino teve uma votação pouco significativa, em decorrência também da repressão que impedia que o BOC organizasse atividades de campanha, inclusive Minervino de Oliveira foi preso pelo menos duas vezes, uma em Ribeirão Preto (SP), quando presidia a realização de um congresso de trabalhadores agrícolas, e outra no bairro carioca de Bangu. Com a vitória do movimento revolucionário de outubro de 1930, que levou Vargas ao poder após sua derrota nas urnas, Minervino voltou a ser preso por mais algumas vezes. As atividades do BOC são encerradas em 1930 após uma nova orientação vinda da Internacional Comunista, que afetava diretamente a política do Partido Comunista. [1] Propaganda da campanha eleitoral do Bloco Operário e Camponês. [2] Periódico A Classe Operária, nº 18 25/08/1928. Disponível em https://bndigital.bn.gov.br/artigos/a-classe-operaria/. [3]DECCA, Edgar de. 1930: O silêncio dos vencidos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.

  • OS ATOS INSTITUCIONAIS NA DITADURA: O QUE FOI O AI-5?

    Por Milena Maria Rossi; João Victor Reis Conterno e Veronica Marques da Costa (graduandos em História - Unioeste) O período entre 1964 e 1985 foi marcado pelos atos institucionais e por crimes praticados por parte de setores das forças armadas e das polícias civis que eram verdadeiros atos de terrorismo. Tais atos incluíam torturas, assassinatos, desaparecimentos, sequestros de crianças dentre outros crimes, realizados para silenciar quem se opunha ao regime. Isso é o que a historiografia chama de Terror de Estado. O sentido do Terror de Estado é de silenciamento da população, rejeitando por completo qualquer questionamento ou criação de movimentos de oposição sendo identificadas como nociva e perigosa. O golpe de 1964 e os Atos Institucionais na ditadura Para garantir que o Golpe de 1964 perdurasse, os militares pouco a pouco foram desmontando os mecanismos que garantiam o Estado de Direito no Brasil por meio dos Atos Institucionais, que fundamentavam legalmente as ações do Estado e a sua relação com a sociedade Civil. Os atos institucionais são decretos elaborados pelo presidente que estavam acima de qualquer outro decreto, lei e até mesmo da constituição. Nos cinco (05) primeiros anos do regime militar foram criados dezessete (17) atos institucionais, nos quais os cinco primeiros foram extremamente importantes para a legitimação da coerção do estado, escancarando a repressão e o autoritarismo dos governantes militares. Em 1964, alguns dias após o golpe, foi declarado o primeiro ato institucional. Este determinava que as eleições para presidente e vice-presidente seriam indiretas, ou seja, sem a participação popular. O AI-1 também dava ao governo militar o direito de cassar mandatos legislativos, suspender servidores públicos e retirar direitos políticos por 10 anos. O AI-1 abria as portas para o regime militar e para a criação dos próximos atos institucionais. O segundo ato institucional foi criado em 1965 durante o governo do primeiro militar: Humberto de Alencar Castelo Branco. O mesmo general assinou os atos institucionais 3 e 4. O AI-2 dissolveu todos os partidos políticos que existiam até então, e criou a política de bipartidarismo, ou seja, apenas dois partidos podiam existir, eram eles: a Aliança Nacional Renovadora (ARENA) representando o governo militar e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) que agia como uma oposição moderada. O AI-2 também dava permissão ao presidente de decretar “Estado de Sítio” por 180 dias, sem a consulta prévia do congresso. Os atos institucionais 3 e 4, assinados em 1966, serviram para expandir ainda mais o controle militar. O AI-3 estabelecia eleições indiretas para governadores e vices e o AI-4 convocava uma sessão especial do congresso federal a fim criar uma Constituição, legitimando o governo militar. Todos estes atos acabaram por preparar as instituições para a implementação do AI-5. Considerado o mais violento, repressor e autoritário de todos, o AI-5 garantia amplos poderes ao executivo, permitindo que o então presidente Artur Costa e Silva fechasse o congresso. O ato institucional permitia também que fossem cassados os mandatos parlamentares de senadores e deputados que se posicionavam contra o regime, também suspendeu a habeas corpus, que garante o direito à liberdade de locomoção e instaurou a censura. O AI-5 foi a principal ferramenta institucional de controle do regime, deixando explícito o autoritarismo do governo militar. Tal medida durou até 1978, no governo de Ernesto Geisel, o penúltimo presidente do regime ditatorial militar. O discurso da seguranca nacional A questão da segurança institucionalizada através dos Atos foi ligada diretamente ao conceito de desenvolvimento do país. Castelo Branco em 1966 salientou em seu discurso o binômio “segurança e desenvolvimento” e esses conceitos passaram a ser utilizados para legitimar uma nova política econômica diretamente ligada à exploração dos trabalhadores, a abertura econômica do país para empresas multinacionais e para o capital internacional. Em nome do desenvolvimento foram realizados empréstimos bilionários de instituições financeiras internacionais; que mais tarde, viriam a culminar na crise da dívida externa vivida nos anos 80, e que teve como consequência o arrocho salarial dos trabalhadores, ou seja, o reajuste do valor do salário não acompanhava a inflação do país destruindo a qualidade de vida da população brasileira. [1] Arquivo Nacional, Correio da Manhã, PH fotografia 00555.012. [2] Arquivo Nacional, Correio da Manhã, PH fotografia 00229 051. [3] BUENO, Bruno Bruziguessi. Os fundamentos da doutrina de segurança nacional e seu legado na constituição do estado brasileiro contemporâneo. Revista Sul-Americana de Ciência Política. v 2, nº1. Pelotas/RS, 2014. p. 45-64. [4] PADRÓS, Enrique Serra. Terrorismo de Estado: reflexões a partir das experiências das Ditaduras de Segurança Nacional. In: GALLO, Carlos Artur (org); RUBERT, Silvania (org). Entre a memória e o esquecimento: estudos sobre os 50 anos do golpe civil-militar no Brasil. Editora Deriva. Porto Alegre, 2014. p. 13-36.

  • As Grandes Emigrações Europeias para as Américas

    Por Méri Frotscher Kramer (Professora - Unioeste) Se hoje a Europa é um continente de imigração e refúgio para muitas pessoas da África, América e Ásia, no século XIX milhões de emigrantes deixaram os portos europeus à procura de melhores condições para viver. De 1815 a 1920, cerca de 60 milhões de europeus emigraram, 71% para a América do Norte, 21% para a América Latina e 7% para a Austrália. Os que emigraram até 1880 eram sobretudo do Norte da Europa (irlandeses e alemães). Os que emigraram depois, entre 1880 e 1915, eram principalmente do Leste e do Sul da Europa, onde a pressão demográfica chegou mais tarde. Mais uma vez nessa onda os EUA receberam a maior parte desses emigrantes.[1] A revolução industrial e mudanças na estrutura agrária causaram profundas transformações sociais e econômicas em diversas regiões na Europa, fazendo emergir a chamada “questão social”. O aumento populacional pressionou o setor agrícola e a mudança dos métodos de arrendamento, cultivo e produção acabou levando muitos camponeses e artesãos a emigrar. As grandes emigrações foram possíveis a partir do reconhecimento da liberdade, sob influência dos valores liberais da revolução francesa. Eles inspiraram o princípio “ubi bene – ibi pátria” (onde se vive bem, aí está a pátria). A ideia de “Fazer a América”, lugar da liberdade e da fartura, onde a terra era abundante, se difunde. A partir de 1880, com a substituição total da vela pelo vapor nos navios e o espraiamento das ligações ferroviárias, a emigração torna-se um fenômeno em massa, um negócio muito rentável para os interesses comerciais de agentes, recrutadores e armadores. A litogravura alemã acima, aborda criticamente o que chama de “exportação” de pessoas: enquanto pelo portão à esquerda entram mercadorias, “exporta-se” pessoas pelo portão à direita. Nem sempre razões econômicas eram as mais fortes, já que pessoas de mais posses e profissionais liberais também emigraram. É o caso de muitos liberais da “geração de 1848” e de socialistas e anarquistas, os quais chegaram a fundar comunidades nas Américas. Mas como os próprios sujeitos vivenciaram e narraram suas experiências migratórias? O que podemos aprender com suas escritas de si? Vejamos o diário de um jovem da Prússia que embarcou no porto de Hamburgo em 1862: “Aos 8 de setembro de 1862 deixei a minha pátria a fim de partir para o Chile, na América do Sul. Tentei facilitar a despedida dos meus queridos pais, não perdendo de vista o meu objetivo e, além disso, depositando minha esperança no reencontro, se assim for o desejo de Deus”. [2] Pela leitura do diário logo se descobre que ele acaba embarcando rumo ao porto de Rio Grande, no sul do Brasil. No diário, a emigração é vista como possibilidade de exercício da liberdade. Ele se coloca como precursor do projeto emigratório familiar, já que pais e irmãs se juntam a ele depois de receber cartas suas. Como toda fonte, diários e cartas precisam ser contextualizados e interpretados com cuidado. A depender dos destinatários e dos interesses do remetente, as cartas podiam conter autocensuras e exageros, como rememora um padre sobre cartas enviadas da colônia Blumenau à Alemanha: “As cartas traziam imagens extremamente exageradas. Elas eram deixadas em cima da mesa familiar ou eram trazidas ao pároco, que as lia minuciosamente e do púlpito da igreja transmitia as lembranças e cumprimentos enviados”.[3] Jornais locais na Europa publicavam cartas de emigrantes tanto para defender a emigração, como para denunciar as questões sociais que a engendravam, a depender de seu posicionamento político. O jornal liberal Allg. Ausw. Zeitung da Turíngia, Alemanha, por exemplo, publicava cartas positivas como incentivo à emigração para as fazendas de café do Brasil. [4] Ao contrário, cartas podiam ser apreendidas nos correios para se impedir a emigração. É o caso de cartas de poloneses emigrados para os EUA e Brasil em 1890 e 1891 confiscadas pelas autoridades czaristas. Essa interferência impediu muitos de irem ao encontro de seus amigos e familiares.[5] Mas muitos imigrantes eram analfabetos. Isso não impedia de pedirem para outras pessoas escreverem cartas em seu nome. Elas revelam os diferentes níveis de instrução entre eles. Cartas podiam ser as únicas pontes que ainda ligavam os familiares separados pelo Atlântico. Numa carta escrita em 1855 da colônia Dona Francisca, Santa Catarina, Ida assim expressa afetos e saudades: “Sim, minha querida mãe, eu acredito que vocês também se alegram quando recebem cartas nossas; mas maior que a nossa não pode ser a vossa saudade e alegria. Vocês continuam a viver nas velhas circunstâncias, nada que é estranho vos cerca; também todos vocês ainda tem parentes e amigos, só uma pequena fresta se abriu com a nossa partida. Não assim é conosco, nós somos os que emigraram, e mesmo que estejamos aqui, entre conterrâneos, eles são estranhos [...] procuramos sempre no passado o que o presente não nos pode dar”.[6] Como se vê, diários e cartas de migrantes oferecem mais que informações objetivas, nos dão acesso aos sentimentos, avaliações, expectativas, frustrações, crenças e, por isso, ajudam a apreender dimensões subjetivas da migração. [1] KLEIN, Herbert. Migração internacional na história das Américas. In: FAUSTO, Bóris (Org.) Fazer a América. São Paulo: Edusp, 2000, p. 21-25. [2] Diário de Paul Schwarzer, 1862-1864. Acervo do Arquivo Histórico de Blumenau. [3] Padre Stanislau Schaette, Blumenau. [4] Jornal especializado no tema da emigração - Rudolstadt, Alemanha. https://zs.thulb.uni-jena.de/servlets/MCRFileNodeServlet/jportal_derivate_00034336/AWZ_5_1851_Nr129.pdf [5] KULA, M. Carta dos imigrantes do Brasil. In Anais da Comunidade Brasileiro-Polonesa. 8, p. 9-16, 1977. [6] Carta de Ida Dörffel à sogra Christiane Dörffel. Dona Franziska, 16.11.1855. p. 152. Sobre isso vide também o livro de Marcin Markovski. https://europeandesign.org/submissions/we-are-all-migrants-letters-of-polish-immigrants-from-america-in-the-late-19th-century/

  • O luxo e a glória de Luís XIV

    Nos infográficos e no vídeo a seguir pretendemos refletir sobre a construção da imagem pública de Luiz XIV conduzida por literatos, modistas, pintores, arquitetos, escultores, poetas, coreógrafos e todo um arsenal de artistas pagos para exaltar, em suas obras, a figura do Rei. Não é por acaso, portanto, o lugar marcante de Luis XIV no imaginário coletivo, pois havia entre o rei e seus conselheiros uma grande preocupação com a imagem real: muito tempo era gasto com os rituais da corte, cenários, vestimentas, peças teatrais, festivais, decorações e retratos.

  • As Reformas Religiosas do Século XVI

    Infográfico do acadêmico Marcos Gabriel Ruas Benedito (História - Unioeste) sobre os principais nomes da Reforma Protestante do século XVI e a seguir vídeo produzido pelo Laboratório de Ensino de História para o Canal do Youtube Curta História sobre a questão da leitura e do impacto da invenção da imprensa no contexto da Reforma Protestante.

  • A expansão marítima e o mercantilismo

    Infográfico e vídeo produzidos pelos acadêmicos da disciplina de História Moderna I (Curso de História da Unioeste), como parte das discussões da disciplina. O vídeo a seguir sobre a expansão marítima portuguesa e os imaginários sobre a África e os perigosos mares desconhecidos para os europeus, foi produzido como parte da disciplina de História Moderna I, cujo roteiro foi escrito pelos acadêmicos Samuel Antônio de Grandi, Aline Mariela Binsfeld e Maria Isadora Galvão Gaeski (acadêmicos do curso de História da Unioeste) e contou a apresentação da acadêmica Maria Isadora Galvão Gaeski.

  • Bruxas e Feiticeiras na Era Moderna: sobre o livro O Calibã e a Bruxa de Silvia Federici

    Resenha de Claudia Monteiro (Unioeste, Campus de Marechal Cândido Rondon) A bruxa é uma personagem importante do imaginário ocidental, está presente de maneira bastante intensa e perturbadora em filmes de terror, em contos de fada, em romances, em obras de arte... Desde crianças estamos acostumados a ouvir e a temer histórias de bruxas. Mas qual é a história das bruxas? Porque centenas de milhares de mulheres foram queimadas no passado sob a acusação de bruxaria? A historiadora Silvia Federici no livro “Calibã e a Bruxa”, busca nos contar um pouco dessa história, procurando entender o porquê dessa perseguição às mulheres na época moderna. A partir um viés marxista e trazendo ao mesmo tempo as questões de gênero, a historiadora problematiza grande parte da historiografia que vê a culpa da perseguição nas ações das próprias vítimas: era a mulher delirante que teria afirmado o prazer da cópula com o demônio, a tola que usava uso de feitiços malignos ou a louca que protagonizava em crimes hediondos. Há uma misoginia na historiografia sobre o tema da bruxaria e da feitiçaria que incrivelmente ainda joga a culpa sobre as mulheres, vítimas de séculos de perseguições, torturas e fogueiras. Pois não podemos nos esquecer que a tortura foi o meio oficial da Inquisição alcançar suas verdades. Aquelas mulheres consideradas bruxas admitiram todo o tipo de coisa para se livrar da dor e da violência a que eram submetidas nos interrogatórios do Santo Ofício. Enfim, as pesquisas sobre o assunto em geral foram escritas do ponto de vista favorável à execução das mulheres, retratadas como fracassos sociais ou até mesmo como pervertidas, isso acabava corroborando a própria visão dos demonólogos da Inquisição, E essa mesma visão de acusação e de medo da mulher e da bruxaria é reproduzida nos contos de fada e também em grande parte da produção cinematográfica, dos filmes e séries que retratam o tema, a mulher é sempre a sedutora, a maléfica, a demoníaca... Somente com o advento do movimento feminista é que a história das bruxas começou a ser vista de modo diferente. A bruxa clandestina passa a ser vista como um verdadeiro símbolo da rebeldia feminina. O primeiro ponto questionado pelas feministas era a misoginia com que a mulher sempre foi retratada na história, escrita durante muito tempo quase que, exclusivamente, por homens. As feministas trouxeram ao debate as questões relacionadas ao controle do corpo, da sexualidade e dos saberes e conhecimentos das mulheres, pois as mulheres foram perseguidas e condenadas por bruxaria por tais práticas que, antes, eram consideradas como benéficas e necessárias para as comunidades em que viviam: Conhecimentos tais como ervas contraceptivas e abortivas, unguentos e chás com poder curativo, rezas e rituais para boa colheita, etc... Junto com o corpo da mulher foi condenado também um saber que ela detinha. O tema da caça às bruxas foi tido muitas vezes como secundário ou até mesmo como folclórico por diversos historiadores, Silvia Federici, pelo contrário, argumenta a centralidade desse processo e sua relação com a acumulação primitiva e o surgimento do capitalismo. É significativo que a caça as bruxas tenha ocorrido ao mesmo tempo do processo de cercamentos ingleses, do começo do tráfico de escravos, do domínio e colonização na América, e da promulgação das Leis Sangrentas contra vagabundos e mendigos. Ou seja, todo o processo que define o começo do capitalismo e a formação de uma massa de proletariados. A caça às bruxas foi essencial para a desintegração das comunidades camponeses, dividindo homens e mulheres, combinado com o ataque e privatização das terras pelos cercamentos, inculcou nos homens camponeses o medo do poder das mulheres e destruiu todo um universo de práticas, crenças e sujeitos sociais, tal como a mulher curandeira e feiticeira. É um consenso na historiografia que esse é um processo da época moderna, pois, na Idade Média não houve julgamentos e execuções massivas de bruxas, somente no século XV é que isso vai começar a ocorrer. Também no século XV se desenvolve a doutrina sobre bruxaria, na qual a feitiçaria foi declarada uma forma de heresia e como crime máximo contra Deus, contra a natureza e contra o Estado, é nessa época também, que foi escrito o tristemente célebre Malleus Maleficarum (O Martelo das feiticeiras). Juristas, magistrados e demonólogos sistematizaram argumentos e deram forma burocrática aos julgamentos, a eles se juntaram importantes intelectuais tal como Hobbes e Bodin. A perseguição não foi um processo espontâneo, mas parte de uma iniciativa que envolveu o Estado recém surgido. A Igreja Católica forneceu o arcabolso metafísico e ideológico para a caça as bruxas, mas ao contrário do que se parece, a caça as bruxas não foi somente o resultado da Inquisição, pois ela ocorreu de igual forma nos países protestante onde a Inquisição não atuava. Isso comprova a natureza política da caça às bruxas, e o papel do Estado nesse processo. Mas por quê essa violência contra as mulheres? Pelo contexto em que surgiu, podemos sugerir que isto tem relação com a resistência das mulheres contra a difusão das relações capitalistas: os crimes das bruxas era o mau-olhado, a maldição pela negação da esmola, a inadimplência do aluguel, a pobreza, a velhice... Outra questão era o poder e conhecimento que as mulheres detinham sobre o seu próprio corpo, especialmente as práticas contraceptivas e abortivas. Essas práticas que eram anteriormente aceitas e inclusive eram necessárias para as comunidades, passaram a ser consideradas diabólicas e condenáveis. Impedir a mulher de controlar sua própria sexualidade e a sua possibilidade de escolher ter filhos ou não, era controlar a reprodução da força de trabalho, transformada em recursos econômicos (como mercadoria) pelo novo modo de produção em ascensão: o capitalismo. A caça às bruxas foi o primeiro passo de um longo caminho rumo ao sexo limpo e à transformação da atividade sexual feminina em trabalho à serviço da procriação. Referências: FEDERICI, Silvia. O Calibã e a Bruxa. Editora Elefante, 2017. #SilviaFederici #OCalibãeaBruxa #Bruxaria #Feitiçaria #históriamoderna #acumulaçãoprimitiva #HistóriaModerna #HistóriadasMulheres #PerseguiçãoBruxas #Inquisição #Martelodasfeiticeiras

  • O Queijo e os Vermes - Carlo Ginzburg

    Resenha de Marcos Gabriel Ruas Benedito (Acadêmico do curso de História -Unioeste) "Temos, por um lado, dicotomia cultural, mas, por outro, circularidade, influxo recíproco entre cultura subalterna e cultura hegemônica, particularmente intenso na primeira metade do século XVI”. (GINZBURG, C.) A obra de Carlo Ginzburg é um prócer por dois motivos: em primeiro lugar, é o magnum exemplo da corrente historiográfica da microhistória (que com Ginzburg, passou a ganhar maior presença no campo da ciência), e em segundo lugar, possui uma narrativa atrativíssima durante a exposição dos julgamentos e visões do protagonista Menocchio, um singelo moleiro que ousou discutir em pé de igualdade com os inquisidores. As primeiras páginas do livro dedicam-se a um argumento do autor. Aqui, Ginzburg dedica-se a explanar suas considerações acerca do que seria a microhistória, a história das mentalidades e principalmente, a história cultural. Carlo rebate autores que pressupõem um único elemento de uma dita tradição cultural como fruto homogêneo de toda uma camada popular, ignorando as especificidades por dentro da mencionada. Como exemplo demonstrativo, o autor cita o cordel, objeto de estudo de Robert Mandrou e Geneviève Bollème. Mandrou e Bollème, na visão de Ginzburg, teriam se apressado em definir o cordel como expressão livre de uma cultura popular, estereotipando então o imaginário camponês como sendo “adocicado”, “fatalista” e deveras “fantasioso”. Apoiando-se não só em estudos próprios, como também nos estudos de Bakhtin, Carlo Ginzburg então explana que a problemática muda de figura ao analisar a “cultura imposta às classes populares” e não a cultura “produzida” por tal classe. Antes, o autor cita que o historiador se sente desencorajado, não sem motivos, em estudar tais fenômenos, uma vez que grande parte da cultura popular é transmitida oralmente, com escassos registros históricos. E o que se tem de registros históricos, muitos foram escritos por autores que estudaram o tema em suas respectivas épocas, dando margem para uma delimitação visionária e uma “deformação” da tradição real. Nem tudo é pessimista, todavia, uma vez que chegamos a um ponto crucial do argumento inicial de Ginzburg: os mundos culturais da classe dominante e subalterna não são inteiramente distintos, anuladores um do outro ou necessitados de estudos generalizantes acerca de cada um. Portanto, temos, no argumento de Ginzburg, a clarificação do primeiro motivo do porquê da importância de sua obra: é um estudo que redefiniu as bases do pensamento da história cultural, partindo de um novo ângulo, uma nova problemática, tratando das especificidades de cada mundo, de cada classe, sem generalizar, sem oferecer um panorama macro apressado ou presunçoso. O maior exemplo do elo ligante entre classes que comprova a afirmação anterior é o Carnaval (fator também considerado por Bakhtin): a própria natureza carnavalesca (a liberdade, promiscuidade, a abundância, a felicidade, o festim dionisíaco) era um contraponto ao dogmatismo e o conservadorismo da classe dominante. Logo, podemos ver que as culturas de cada classe se interligavam, tal como o autor disse, em uma espécie de circularidade. Clarificado o primeiro motivo, vamos ao segundo: a narrativa. Há de se começar descrevendo quem é o protagonista do estudo de Ginzburg. Domenico Scandella, apelidado de Menocchio, era um moleiro da vila de Montereale, próxima de Pordenone, na região Friuli. Casado, tinha filhos, era alfabetizado (fato que o ajudou a argumentar com grande capacidade em seus julgamentos) e era descrito por seus conterrâneos como sendo questionador. Chamava a atenção pelas suas visões religiosas únicas e que contrapunham os dogmas católicos. A figura de Menocchio se demonstra singular e interessante em sua descrição prévia. Ele era alfabetizado, característica rara e notável para quem não era da elite, contudo, não era um intelectual, um cardeal ou um acadêmico. Não detinha em suas mãos uma vasta biblioteca com centenas de livros. Não sofreu inspiração ou meramente reproduzia visões de intelectuais (Ginzburg traça diversas vezes paralelos entre o pensamento de Menocchio com o de alguns autores pagãos, de seitas como os benandanti, e de intelectuais como Dante, contudo deixa claro que existe a possibilidade de Menocchio ter entrado em contato com as ideias de tais figuras, mas não afirma certeza), mas sim tinha criado suas próprias ideias. Menocchio, portanto, difere e muito da estereotipada visão adocicada e passiva que se tinha na historiografia dos populares. Denunciado à Inquisição por um pároco local, Menocchio teve seu primeiro julgamento em 1583. Ali, pode-se ver em detalhes diversas das visões do moleiro. Relativizou a blasfêmia, declarando que a mesma só traz malefícios ao blasfemador, descartando seus efeitos a quem a ouve (há de se lembrar que a blasfêmia era um dos mais graves crimes no processo inquisitório). Duvidou da virgindade de Maria, dizendo que uma mulher é incapaz de dar à luz e continuar virgem. Discordou da vinda divina de Jesus Cristo, dizendo que nasceu do homem e que sua morte não foi um sacrifício salvador da humanidade, qualificando, portanto, a morte de Jesus como sendo um ato de penitência como qualquer outro. Desqualificou todos os sacramentos como sendo simples peças de negócios por parte da Igreja, criticou a arrogância do clero (afirmando que tal como o próprio Diabo, o clero buscava saber mais que Deus e se equiparar a ele), a riqueza acumulado por seus membros e por fim, a própria estrutura do julgamento inquisitório, pois achava uma armadilha e uma injustiça com os mais pobres utilizar-se de uma língua incompreensível como o latim, fazendo com que os réus se confundissem facilmente. Finalmente, Menocchio demonstrou um ato de tolerância religiosa, declarando que muito embora prefira ser católico, Deus salvará a todos, mesmo que seja judeu, islão, herege ou turco. Nesta listagem, vê-se que Scandella era um homem com visões distintas grandemente dos dogmas e práticas da Igreja Católica, com pensamentos minoritários se considerarmos a sua época. Importante notar que, Menocchio não atingiu alto grau de imaginário próprio sozinho: ele possuía alguns livros (a maioria por empréstimo), como por exemplo Il fioretto della Bibbia (uma tradução de um compilado de crônicas catalãs medievais), Il Lucendario de santi (uma tradução italiana da Legenda Áurea), Zampollo (um livro cuja descrição do Paraíso se assemelha a de Menocchio), o Decameron de Bocaccio, dentre outros. Todavia, o moleiro não simplesmente reproduziu fielmente os pensamentos dos livros, como dito anteriormente, mas sim os interpretou a sua maneira. Inclusive, um livro não identificado possuído por Menocchio é destacado como sendo uma possível tradução italiana do Alcorão, o que pode ter auxiliado Domenico em sua visão tolerante. A eminente parcela do pensamento de Menocchio, está, porém, em sua visão a respeito da cosmogonia, que era completamente única. Para ele, tudo o que existia anteriormente era o caos, isto é, os quatro elementos clássicos misturados em um só, formando uma grande massa, tal como o queijo é formado do leite, com vermes então aparecendo nesta grande massa, sendo os anjos. A majestade divina (que Menocchio deixa implícito não ser o próprio Deus) decretou que um dentre os anjos, que seria Deus, seria o lorde comandante com quatro capitães: Lúcifer, Miguel, Gabriel e Rafael. Lúcifer, por querer se equiparar ao poder supremo, foi então expulso juntamente com seus simpatizantes pela sua arrogância. Deus, então, criou Adão, Eva e a humanidade para preencherem o lugar deixado pelos anjos caídos. E, quando a multitude não seguiu os comandos de Deus, ele então enviou seu filho, Jesus, que foi então crucificado. Tamanha criatividade para imaginar uma visão cosmogônica tão detalhada é o principal artifício que prende também um leitor mais casual à obra, uma vez que sem sombra de dúvidas levanta curiosidade sobre como um moleiro alfabetizado, que tinha lido alguns livros apócrifos e traduções de outros livros distantes, chegou a tal ponto. Ler o julgamento de Menocchio não é simplesmente um ato de estudo, mas também um ato literato e de grande apetrecho narrativo. Quanto ao destino de Menocchio, uma nova série de questionamentos por parte dos inquisidores o levou a se contradizer diversas vezes, denunciando ainda mais sua discordância profunda em relação aos preceitos dogmáticos (por mais que Menocchio a princípio tenha declarado que seus pensamentos vieram por “intervenção diabólica”), acabou por tê-lo condenado à prisão no ano seguinte (1584), ainda que Scandella tenha escrito uma carta renegando seu pensamento. Após passar vinte meses em cárcere, uma intervenção de seu primogênito resultou em sua soltura, mas ainda assim condenado em prisão domiciliar, a carregar um símbolo de uma cruz carbonizada como aviso de seus crimes em suas roupas e a não sair de Montereale (parte que depois foi flexibilizada, desde que com a autorização de uma autoridade local). Contudo, a natureza questionadora de Menocchio (aliada a seu desejo de recontar seus pensamentos a príncipes, nobres e reis) o levaram a se isolar da comunidade em seu retorno e a retomar suas falas divergentes das da Igreja. A perda gradual de sua família (a esposa e o primogênito morreram, e sua filha, Giovanna, já havia se casado anos antes, juntamente com a deixa de seus outros filhos) também o afetou, assim como a marca da cruz em sua roupa o deixou estigmatizado por quem o via. Finalmente, em 1598, um forasteiro, abismado com os questionamentos de Menocchio, o denunciou novamente à Inquisição. Em seu segundo julgamento, Menocchio admitiu com maior firmeza ele ter sido o próprio autor de suas ideias, embora tenha adotado uma postura mais defensiva e pedindo clemência. De nada adiantou, e Domenico Scandella foi considerado um heresiarca, sendo executado por carbonização em 1599. Em suas palavras finais, Ginzburg destaca que ao mesmo tempo em que Menocchio era julgado pela segunda vez, Giordano Bruno também era julgado em Roma. Logo, podemos ver uma vez mais a comprovação do autor da circularidade cultural recíproca, afinal, tanto o mundo popular e o intelectual se equipararam em uma questão comum, não sendo completamente distintos um do outro. Pode-se inferir então, que estudos micro como o da análise do caso de Menocchio são de grande valia para a História, uma vez que se pode analisar de uma forma muito mais aprofundada e abrangente as relações sociais em uma época, as especificidades de cada cultura, e, principalmente, a função que cada uma dessas particularidades exerceu em seu tempo, para que assim exista uma melhor compreensão do processo histórico. INFOGRÁFICO DE LUÍZA BEILKE KUNTZ (ACADÊMICA DO CURSO DE HISTÓRIA DA UNIOESTE) #OQueijoeosVermes #Ginzburg #Inquisição #História

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